HISTÓRIAS DA MINHA INFÂNCIA E JUVENTUDE (12)
SANTA CRUZ, A PRAIA DA NOSSA INFÂNCIA; O PENEDO DO GUINCHO E A PRAIA FORMOSA
Dista do Sobral cerca de 40 kms e era a nossa praia, aquela onde passávamos uns 15 dias de férias, com direito a casa alugada na zona por detrás da Colónia da Física, hoje NOAH, com uma mercearia mesmo ao lado e do outro lado do muro o parque de campismo de Torres Vedras. Pertíssimo da praia, onde o sr António tinha guardada a nossa barraca, de listas azuis e brancas, uma mesa quadrada e 2 bancos de madeira.
Era aí que a avó Sara tomava conta de mim e dos meus irmãos e nos levava todos os dias, religiosamente, para a praia, de manhã e à tarde, “obrigando-nos” a uma sesta depois de almoço. Tomar conta de 3 miúdos entre os 6 e os 10 anos não devia ser tarefa fácil mas a avó tomava conta dos seus “pintainhos” como qualquer mãe-galinha. E uma vez por semana, na folga do meu pai, lá estava ele e a minha mãe a acompanhar esta troupe.
A avó controlava os horários como poucos, com o seu minúsculo relógio, e controlava as idas a banhos conforme a maré estava vazia ou cheia, se havia ondas ou não, deixando-nos ir até ás rochas defronte do penedo chamado de “boca de sapo” ou mais para norte um pouco se o mar estava bom. Lá andava ela, na beira-mar, a ver se estávamos bem e não nos afastávamos muito. Por vezes juntavam-se a nós os nossos primos António José e Lurdes, cuja casa ficava no caminho para o aeródromo, e a tia Crielmina acompanhava a avó no controle da malta.
Belas banhocas, jogos de bola, jogar á carica, apanhar lapas e mexilhões, pescar uns cabozes, eram a nossa grande ocupação durante esses dias de praia.
Se o mar estava mais batido, a avó, com os seus “pintainhos” percorria toda a extensão de areal que vai até à praia Formosa, com a sua rampa dos crocodilos e uma pequena piscina, passando pelo emblemático Penedo do Guincho, para que pudéssemos tomar banho na enseada da Formosa em segurança. E quando achava que era altura de voltar à nossa barraca, tocava a recolher a malta e lá íamos todos, sem nunca algum se ter perdido.
As economias eram parcas e o dinheiro tinha de ser muito bem administrado. Por isso, e apesar de haver uma senhora que vendia bananas e bolos/farturas, outro senhor que não tinha um braço e vendia gelados da Olá e uma oficina de bicicletas que as alugava à hora, umas vezes por outras tínhamos direito a um destes miminhos num dia de praia.
Encontrávamos muitos colegas de escola, também filhos dos colegas do meu pai e do meu padrinho na Lopes & Matos e estabeleceram-se relações de amizade. Quando nos juntávamos todos ao fim de semana na praia, éramos mais de uma dúzia e nunca a minha avó perdeu o controle da situação. Tínhamos idades bem diferentes (6 ou7 anos de diferença entre mais novos e mais velhos) mas aproveitávamos os momentos em que estávamos juntos para sacar o máximo partido da praia, da nossa praia.
E às vezes, mesmo em Agosto, lá vinham as neblinas molhadas típicas de Santa Cruz, ao final do dia ou logo de manhã, ou ainda nos dias de marés vivas, as ondas a chegarem às barracas e toda a malta em grande alvoroço a construir muralhas de areia, piscinas, etc. Nesses dias nem à Formosa íamos, mas a animação era constante. E chegando á nossa casinha, um banho de mangueira que tinha ficado ao sol para a água aquecer…
Ainda hoje, 50 anos volvidos, Santa Cruz é a minha praia de eleição, de inverno e de verão!
António Lúcio
Sobral de Monte Agraço, 28 de dezembro de 2022